Esse é o “Fala Eletronet”, uma seção especial de entrevistas com nossos principais executivos, onde abordamos os temas que movimentam o mercado das telecomunicações como o panorama da banda larga no Brasil, a adoção de novas tecnologias, regulamentação e muito mais. Nesta edição, conversamos com o nosso especialista em Gerenciamento de Projetos (PMP), Celio Mello, para entender mais detalhadamente a transição do IPv4 para o IPv6. Confira!
Fala Eletronet: O IPv4 está acabando, mas muitos provedores se utilizam ainda do CGNAT para contornar o problema. Quais são as implicações disso?
Celio Mello: Como é de conhecimento geral, o IPv4 tem data certa para o fim. Exatamente por esse motivo, quando foi anunciado pela IANA (Órgão regulamentador da Internet Mundial) em 2011, muitas operadoras e ISPs passaram a fazer uso do CGNAT (Carrier Grade Network Address Translation) para contornar esta limitação de novos prefixos como forma de suportar o crescimento de suas operações, utilizando de forma mais eficiente os prefixos existentes. O CGNAT é uma estratégia de compartilhamento dos IPs públicos por meio de vários IPs privados, ou seja, mais de um usuário utilizará o mesmo IP público para sair para a internet. Essa medida paliativa pode ser um “tiro no pé”, se não for bem controlada e monitorada. Alguns pontos devem ser considerados:
– O primeiro aspecto de atenção refere-se à questão de segurança: O compartilhamento do IP público quebra a conectividade fim a fim, como originalmente concebida no início da internet, pois para o estabelecimento de conexões fim a fim, o endereço de destino é definido e conhecido pelo endereço de origem. Quando os clientes utilizam um IP público para sua conexão com a internet, o ISP ou operadora consegue identificar rapidamente as informações de IP, hora de acesso, qual dispositivo foi utilizado no momento e, caso tenha existido uma possível ação criminosa, as medidas cabíveis são tomadas, pois todas as informações estão disponíveis.
Porém, com o compartilhamento dos IPs públicos, por meio de um CGNAT, a operadora ou ISP não consegue identificar de onde foi feito o acesso, pois dezenas ou centenas de dispositivos podem estar acessando a internet pelo mesmo IP público. Para mitigar esta deficiência, o Provedor ou operadora tem que fazer a identificação da porta que foi alocada para os usuários no CGNAT para identificar qual o dispositivo que fez o acesso.
– Um outro aspecto que podemos destacar refere-se à necessidade de conexão fim a fim que fica prejudicada pelo CGNat na medida em que passa a existir uma “tradução” do endereço IP do dispositivo final para o IP público que é compartilhado. Desta forma, serviços de compartilhamento de arquivos tipo P2P, chamadas de voz, vídeo streaming sobre IP e jogos online ficam inviabilizados e não funcionam nesta modalidade de compartilhamento. Para estes casos, não há alternativas: É necessário a destinação de um endereço IP público para que elas funcionem.
– Outro ponto, é que com a utilização do CGNAT, a quantidade de conexões simultâneas que os clientes poderão estabelecer fica limitada, o que pode atrapalhar muito ou inviabilizar vários tipos de aplicações pelos clientes.
Fala Eletronet: Como o provedor pode de fato mudar para o IPv6? O dual stack é um bom caminho (quais são seus benefícios)?
Celio Mello: A modalidade dual stack é a solução planejada para a transição do IPv4 para o IPv6, pois ela faz com que o ISP ou operadora trabalhe de forma simultânea com os dois protocolos.O principal benefício do dual stack é fazer a transição de forma que não afete negativamente os usuários e clientes do ISP,que acabam tendo mais conforto e melhor adaptação na implantação do IPv6 aotrabalhar com os dois protocolos simultaneamente. É recomendável que sejam utilizados processos e algoritmos que tornem os aplicativos dual stack mais responsivos aos usuários, permitindo que a conexão utilize qualquer um dos dois protocolos, mas dando preferência ao IPv6.
Além do dual stack ou pilha dupla, temos algumas técnicas de transição que ajudam e viabilizam o processo de transição, sendo que podemos destacar a modalidade de utilização de túneis IPv6 em IPv4, estabelecidos pela RFC 4213, também chamado de protocolo 41, onde se inclui o muito conhecido GRE (Generic Routing Encapsulation), normatizado pela RFC 2784 e 2890, que permite a convivência entre os dois protocolos.
Temos também, a modalidade da NAT 444, normatizada pela RFC 6598, para auxiliar no esgotamento do IPv4, por meio do compartilhamento dos endereços IPv4 públicos, também conhecido como CGNAT que permite a tradução de endereços privados em endereços públicos, prolongando a utilização dos atuais IPv4.
E por fim, existem utilizações da modalidade NAT 64, normatizada pela RFC 6146, que permite a utilização de apenas IPv6 na rede do provedor que são traduzidos em IPv4, a partir de um servidor de DNS64 que faz esta tradução permitindo o funcionamento dos prefixos IPv4 em uma rede IPv6. Uma derivação é a modalidade NAT 464XLAT, normatizada pela RFC 6877 que dispensa a necessidade de DNS 64 e permite a tradução por meio de uma ação coordenada de algoritmos e protocolos nos equipamentos do provedor (PLAT) e do cliente (CLAT).
O importante é que o provedor ou operadora avalie as várias modalidades possíveis e previstas nas documentações, que sejam aderentes ao seu ambiente e que permitam que a transição seja realizada de forma coordenada e organizada.
Fala Eletronet: Para aqueles provedores que não se atentarem ao problema e preferirem ficar no IPv4, quais serão os prejuízos?
Celio Mello: Os provedores e operadoras que não se alinharem ao mercado, terão dificuldades com o crescimento no mundo da internet, pois o futuro é em IPv6. A mudança do IPv4 para o IPv6 está sendo gradativa, então por algum tempo, veremos a internet trabalhando com os dois protocolos de comunicação simultaneamente, mas em algum momento no futuro, teremos apenas o IPv6 nos novos dispositivos e aplicações.Então, quem não estiver apto a trabalhar com o IPv6 terá dificuldades de crescimento e distribuição de prefixos aos seus clientes. Os novos dispositivos ainda estão sendo lançados com a compatibilidade de IPv4 e IPv6, mas a tendência é que sejam lançados dispositivos e aplicações unicamente com IPv6. Portanto, a recomendação para o provedor ou operadora de internet, é começar desde já a se preparar e a implantar o IPv6 em sua rede.
Fala Eletronet: O IPv6 está associado a uma necessidade maior de conexão por conta do 5G e da Transformação Digital. Como você tem visto isso hoje?
Celio Mello: A internet está em constante evolução e até onde exploramos o horizonte, não há previsão de alteração deste cenário de expansão. Os estudiosos e desenvolvedores acreditam que teremoscada vez mais elementos como parte integrante deste onipresente ecossistema de conectividade, que vai englobar todos os segmentos da sociedade, incluindo governo, empresas, pessoas, sistemas e dispositivos. O 5G, juntamente com toda a Transformação Digital que está em curso, é parte e viabilizador deste processo, pois seu grande diferencial é permitir que mais dispositivos sejam conectados à internet e,paraisso, é necessário ter um endereço para ser alcançado na rede.
O IPv6, à medida em que permite um número exponencial de novos prefixos, é aliado decisivo deste movimento, com prefixos sendo disponibilizados para motivar este crescimento, restabelecendo a conexão fim a fim entre todos os dispositivos, necessária para as novas aplicações em tempo real, e assegurando a destinação de um IP público para cada um destes bilhares de dispositivos na internet.
Fala Eletronet: Como a Eletronet pode ajudar os ISPs a adotarem esse protocolo?
A Eletronet, desde o início da operação do serviço Full IP, sempre se preocupou em ser transparente aos protocolos, permitindo que tanto o IPv4 quanto o IPv6 trafeguem sem restrição ou limitação em sua rede IP. Para isto, quando o serviço foi lançado, já incluiu a modalidade de dual stack que permite o tráfego de forma indistinta.
Desta forma, a Eletronet está apta e pronta para atender as necessidades de conexão de seus clientes provedores, de forma transparente e aderente com seu ritmo de transição para o IPv6, sem, porém, perder o foco no futuro que será totalmente em IPv6.
Atualmente, a Eletronet permanece trabalhando com a tecnologia dual stack (pilha dupla), ou seja, trabalha na condição de fazer conexões com os dois protocolos (IPv4 e IPv6), ajudando assim os provedores a fazer a implantação do IPv6 em suas redes, utilizando simultaneamente o IPv4. Com a implementação total do “novo protocolo”, a Eletronet, assim como os grandes provedores de conteúdo e acesso, irá fazer a migração total para o IPv6.